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Com preços em 'xeque', Petrobras se arrisca a descolar de pares globais

A Petrobras é, desde o começo de 2020, uma das petroleiras com maior desvalorização entre as grandes empresas do setor. A perda de valor das companhias foi resultado da queda no preço do petróleo ante a retração econômica, agravada pela pandemia. Agora, em momento em que a cotação da commodity se recupera e supera a casa dos US$ 60 o barril, as repercussões negativas em torno da política de preços dos combustíveis da estatal podem acentuar as diferenças no valor dos seus papéis da frente aos pares internacionais.

Levantamento do Valor mostra que a ação da Petrobras acumula, desde o início de 2020, desvalorização de 35,5%, desempenho pior do que a queda de 24,5% da Chevron e de 27,7% da ExxonMobil e, em linha, com a baixa de 35,2% da Shell. Todas as empresas foram penalizadas pela contração sem precedentes da demanda global no ano passado. A ação da BP, com perda de 42,4%, caiu mais que a brasileira.

Operacionalmente bem posicionada com o pré-sal, ativo de baixo custo de extração, a Petrobras vive a expectativa de aumentar o pagamento de dividendos a partir de 2022, em meio à redução da dívida. No ano passado, mesmo diante do choque de preços do petróleo, a empresa cortou em 16,5% a dívida líquida, ou US$ 13 bilhões, no acumulado de nove meses de 2020. Alguns analistas, porém, veem um aumento dos riscos associados às ameaças de uma nova greve dos caminhoneiros sobre a capacidade de geração de caixa da estatal.

O mercado tem reagido mal, nos últimos dias, à prática de preços da Petrobras. Desde a segunda-feira, as ações ordinárias da empresa recuaram 5,1% na B3, na contramão do preço do barril de petróleo do tipo Brent, que subiu 2,7% e superou pela primeira vez o patamar de US$ 60 desde janeiro de 2020. A desvalorização ocorre mesmo após os reajustes anunciados na segunda-feira, de 6,2% para o diesel e 8,2% para a gasolina.

A tensão no mercado teve início na sexta-feira, depois que o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, foi chamado pelo presidente Jair Bolsonaro, a Brasília, para prestar esclarecimentos sobre os preços da estatal. A preocupação ganhou novos contornos, no mesmo dia, quando a empresa confirmou, em resposta a uma notícia da Reuters, que havia decidido, em 2020, estender de trimestral para anual o período limite de apuração da aderência dos preços à paridade de importação (PPI). Na prática, significa que a petroleira pode, num dado trimestre, praticar preços eventualmente abaixo do PPI, desde que a diferença seja mais que compensada no ano.

Não quer dizer que a empresa ficará meses sem reajustar os preços, mas que pode trabalhar com defasagens por tempos maiores. Segundo duas fontes, internamente, na administração da companhia, não há preocupação com a mudança, uma vez que, no consolidado de um ano fiscal, o princípio de alinhamento com o mercado internacional estará mantido. Entre investidores e analistas, porém, o episódio reforçou a percepção de riscos envolvendo a petroleira. Concorrentes da estatal e analistas estimam que a Petrobras está segurando reajustes e trabalhando com preços abaixo do PPI.

Segundo o Bradesco BBI, os fundamentos da Petrobras são sólidos, mas, em cenário de recuperação do petróleo e de defasagem nos preços internos, a companhia brasileira tende a desvalorizar perante a concorrência. “À medida que os preços do petróleo continuam a subir - e vemos razões para isso acontecer no curto prazo - os dividendos e retornos da Petrobras se tornarão comparativamente mais baixos”, cita o banco.

A XP, por sua vez, destaca que a incerteza sobre os preços da Petrobras implica numa grande mudança na tese de investimento da companhia, uma vez que as ações da companhia não deverão acompanhar inteiramente as cotações do petróleo. “No futuro, esperamos que a Petrobras tenha um desempenho inferior às petroleiras globais - bem como aos preços do barril”, afirma o analista Gabriel Francisco, em relatório recente sobre o assunto.

O analista do UBS BB, Luiz Carvalho, não acredita que possível represamento dos preços da companhia impacte nos dividendos. “Mas é possível que por uma maior percepção de risco o desconto atual nos múltiplos [da Petrobras, em relação aos pares] prossiga.”Para ler esta notícia, clique aqui.

Autor/Veículo: Valor Econômico
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