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Defasagem no preço do diesel aumenta após ajuste na política de preços da Petrobras

A defasagem do preço interno do diesel em relação às cotações internacionais aumentou a partir do segundo semestre de 2020, depois que a estatal promoveu um ajuste em sua política de preços estendendo o prazo para avaliação da paridade de importação dos produtos.

Nesta segunda (8), a Petrobras anunciou aumentos nos preços da gasolina, do diesel e do gás de cozinha, mas ainda assim suas ações tiveram forte desvalorização nas bolsas, diante de dúvidas a respeito de interferências em sua política comercial.

Na Bolsa de São Paulo, as ações preferenciais, mais negociadas, fecharam em queda de 3,14%, puxando para baixo o principal índice do pregão paulista.

Dados compilados pelo Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) a pedido da Folha indicam que a estatal iniciou 2020 acompanhando de perto o mercado internacional, principalmente nos meses de queda abrupta após o início da pandemia.

Quando os preços internacionais começaram a subir, já como reflexo do relaxamento das medidas de isolamento social ao redor do mundo, a resposta da estatal ocorreu de forma mais lenta e com menor intensidade, mostra o levantamento.

A análise considera os preços de paridade de importação divulgados pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) com base em informações da consultoria S&P Platts, que começaram a ser publicados em 2019 como uma referência oficial para acompanhamento do mercado.

Foi feita com os preços praticados em quatro importantes mercados: São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Paraná. Na última semana de janeiro, o litro do diesel era vendido nas refinarias da Petrobras por cerca de R$ 0,20 a menos do que o preço de paridade calculado pela ANP.

Em junho, a Petrobras estendeu de três meses para um ano o prazo para avaliação da paridade internacional dos preços dos combustíveis, o que significa que pode passar mais tempo vendendo abaixo das cotações internacionais, desde que recupere as perdas depois.

A empresa nega que a medida seja um sinal de interferência do governo e diz que "a simples modificação do período da aferição da aderência entre o preço realizado e o preço internacional, promovida há oito meses, não se constitui em rompimento com nosso inarredável compromisso com o alinhamento de nossos preços no Brasil aos preços internacionais".

Para os analistas do Bradesco, o cenário pode ter impacto também sobre o processo de venda de refinarias e, em consequência, na distribuição de dividendos no futuro.

Diante da repercussão negativa do caso e de crescentes cobranças sobre o aumento de preços, o presidente Jair Bolsonaro disse a eleitores na manhã desta segunda que não tem ingerência sobre a Petrobras e que não pretende se tornar um ditador para extrapolar os limites que a legislação impõe ao presidente da República.

​"Não é novidade para ninguém: está previsto um novo reajuste de combustível para os próximos dias, está previsto. Vai ser uma chiadeira com razão? Vai. Eu tenho influência sobre a Petrobras? Não", disse Bolsonaro.

"Daí o cara fala 'você é presidente do quê?' Ô, cara. Vocês votaram em mim e tem um monte de lei aí. Ou cumpre a lei ou vou ser ditador. E para ser ditador vira uma bagunça o negócio e ninguém quer ser ditador e... isso não passa pela cabeça da gente", afirmou o presidente.

Bolsonaro já havia reunido a equipe econômica na sexta-feira (5), mas terminou o encontro sem uma medida concreta para reduzir o preço dos combustíveis. Ele propôs um projeto de lei que fixasse a alíquota do ICMS em cada Unidade da Federação ou que garantisse que o imposto estadual fosse cobrado na refinaria, mas foi contestado pelos estados.

​A cota de sacrifício da União se daria pela redução do PIS/Cofins, mas o governo não chegou a apresentar uma solução para compensar a medida. ​​Em um recado aos governadores, o presidente voltou a cobrá-los pela redução do ICMS.

"Os governadores falam que não podem perder receita, que estão no limite. Entendo isso aí. O governo federal também está no limite. É verdade. Agora, quem está com a corda mais no pescoço do que nós, presidente da República e governadores, é a população consumidora."

Defensor da proposta de respeitar prazos mais longos para acompanhar a paridade internacional, o Ineep diz que esse modelo é comum em países com grande produção de petróleo e evitam trazer a volatilidade internacional para o mercado interno.

Para o instituto, as propostas feitas até agora "revelam total falta de estratégia". "Claramente, o governo e a Petrobras não dialogam. Não há entendimento de ambos sobre o papel dos preços dos combustíveis no Brasil e sequer sobre soluções para esse problema", diz o coordenador técnico do instituto, Rodrigo Leão.


Autor/Veículo: Folha de S.Paulo
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