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'Travamos o bom combate', diz presidente da Petrobras a executivos

Demitido nesta segunda-feira (23) pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), o presidente da Petrobras, José Mauro Coelho, fica no cargo até a assembleia de acionistas que será convocada para apreciar a nomeação de Caio Paes de Andrade para comandar a estatal.

O encontro ainda não tem data marcada, mas são necessários ao menos 30 dias entre a convocação e sua realização. Isto é, apesar do anúncio de demissão apenas 40 dias após sua posse, Coelho ainda deve ficar na presidência da companhia até o fim de junho.

Em mensagem enviada nesta terça (24) a grupo de WhatsApp que reúne executivos do setor de energia, o presidente demitido agradeceu manifestações de apoio. "Obrigado pela mensagem. Trabalhamos com responsabilidade e seriedade, travamos o bom combate. Seguimos em frente", afirmou.

Em sua curta gestão, Coelho defendeu a política de preços dos combustíveis e intensificou atuação nas redes sociais com argumentos sobre impactos positivos da estratégia da companhia para o país. Há duas semanas, promoveu um reajuste de 8,87% no preço do diesel.

O aumento levou o valor de venda do combustível a recorde nos postos e acabou justificando a demissão do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, mas não cobriu toda defasagem em relação às cotações internacionais naquele momento.

Na assembleia que vai avaliar o nome de Paes de Andrade, os acionistas terão que eleger ainda 8 dos 11 membros do conselho, que foram eleitos em voto múltiplo no encontro que confirmou a nomeação de Coelho. Só permanecem dois representantes dos minoritários e a representante dos trabalhadores.

O governo ainda não informou se renovará sua lista, mas a expectativa do mercado é que indique nomes mais alinhados ao presidente Bolsonaro, para facilitar eventuais mudanças na política de preços dos combustíveis da empresa.

Analistas do mercado financeiro veem barreiras para mudanças significativas na estratégia da companhia, mas representantes de minoritários já esperam ao menos uma tentativa de reduzir a frequência de reajustes.

VanDyck Silveira, CEO da Trevisan Escola de Negócios, lembra que estratégia semelhante foi usada pela ex-presidente Dilma Rousseff, de forma mais velada, às vésperas das eleições de 2014.

Em depoimentos ao Ministério Público Federal, a então presidente da estatal, Graça Foster, disse que a empresa passou o ano tentando emplacar reajustes para evitar descumprimento de metas de endividamento, mas que a palavra final era do então ministro da Fazenda, Guido Mantega.

"Os aumentos, todos eles, desde o meu primeiro dia até o último dia, eram pelo presidente do conselho", disse ela em depoimento. "Ele ligava para mim e falava: '3 no diesel e 5 na gasolina', e desligava."

"Se o governo quiser usar seus dividendos para subsidiar os combustíveis, o que eu acho um absurdo, é um direito dele", diz Silveira. "É uma solução menos problemática, que gera muito menos distorções do que segurar o preço. Agora, o que não pode ser feito em hipótese nenhuma é uma manipulação."

Um avanço nesse sentido, porém, enfrentará resistências dos investidores privados, que viviam um período de lua de mel com a empresa pelos elevados dividendos distribuídos pelos lucros registrados nos últimos trimestres.

Eles defendem que, para mudar sua política de preços, a estatal precisa alterar seu estatuto, que determina compensação financeira do governo em caso de operações deficitárias para apoiar políticas públicas.

O texto diz que a União somente poderá orientar a companhia a assumir obrigações ou responsabilidades, incluindo projetos de investimento e assunção de custos operacionais, como aqueles relativos à venda de combustíveis por força de lei ou contrato, com custos e receitas discriminados e divulgados de forma transparente.

Nesses casos, continua o estatuto, as obrigações ou devem respeitar as condições de mercado ou devem prever compensação pela União, a cada exercício social, pela diferença entre as condições de mercado definidas e o resultado operacional ou retorno econômico da obrigação assumida.

As restrições foram incluídas no estatuto durante a gestão de Pedro Parente, no governo Michel Temer, adequando o texto a regras criadas pela Lei das Estatais para tentar blindar as empresas públicas de interferência política.

PRÓXIMOS PASSOS DA TROCA NO COMANDO DA PETROBRAS

  • Empresa convoca assembleia de acionistas para eleição de novo conselho, que deve ocorrer em um prazo mínimo de 30 dias após a convocação

  • Governo e minoritários apresentam seus candidatos a 8 das 11 vagas; três delas, eleitas por voto em separado, não precisam ser renovadas
  • Após a assembleia, já com nomes aprovados pelos acionistas, novo conselho de administração se reúne para nomear o presidente da estatal

Se quiser mudar política de preços

  • Não está claro como ou se o governo vai propor uma mudança formal na política de preços da companhia, mas se ocorrer, analistas avaliam que pode ser necessária mudança no estatuto para derrubar restrições a operações com prejuízo por determinação do acionista controlador
  • A mudança no estatuto depende de aprovação também em assembleia dos acionistas
Autor/Veículo: Folha de S.Paulo
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