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Economia busca conter fatura com subsídios para combustíveis

Após ceder e abrir os cofres federais para subsidiar o preço dos combustíveis em ano eleitoral, o Ministério da Economia monitora com atenção os próximos passos do Congresso Nacional na discussão das propostas para evitar que a fatura fique ainda maior.

As medidas acertadas até agora têm um impacto total de R$ 42,5 bilhões até o fim do ano, segundo fontes do governo ouvidas pela Folha. O valor inclui o corte de tributos federais sobre gasolina e etanol e um repasse de R$ 25,7 bilhões a estados e municípios para compensar a redução a zero do ICMS sobre diesel e gás de cozinha.

Nos bastidores, porém, técnicos mostram cautela diante da perspectiva de o valor crescer caso governadores pressionem por uma indenização maior. O Executivo federal desde já atua para evitar que isso aconteça.

Apesar da reclamação dos governadores quanto ao impacto do projeto, parlamentares reconhecem que será difícil travar um projeto que tem o potencial de proporcionar algum alívio no preço. ​

Interlocutores relatam que, nas negociações internas, o ministro Paulo Guedes (Economia) estabeleceu um limite de R$ 50 bilhões para o conjunto das medidas.

Para acompanhar de perto o desenrolar das tratativas e evitar a ampliação da fatura, Guedes cancelou uma viagem que faria nesta terça-feira (7) a Paris, onde participaria de uma reunião da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

Em outros momentos cruciais, como na negociação sobre o valor pago às famílias do Auxílio Brasil, que resultou na mudança do teto de gastos (regra fiscal que limita o avanço das despesas à inflação), o ministro da Economia esteve fora do país e acabou sendo atropelado por outros auxiliares do presidente Jair Bolsonaro (PL).

O valor reservado para as ações de combate à alta dos combustíveis já é considerado elevado. O montante equivale a quase metade de toda a demanda anual do programa Auxílio Brasil (de R$ 89 bilhões).

O repasse de recursos aos estados depende da aprovação de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que terá a relatoria do senador Fernando Bezerra (MDB-PE). Segundo aliados do parlamentar, a discussão sobre a compensação tem ficado nos R$ 25,7 bilhões.

No âmbito federal, o corte de PIS e Cofins deve custar R$ 12 bilhões no caso da gasolina e R$ 3,3 bilhões no caso do etanol. Já a redução da Cide sobre a gasolina deve ter impacto de R$ 1,5 bilhão.

Uma possibilidade é incluir a diminuição dessas alíquotas até o fim do ano no projeto de lei que trata do limite do ICMS sobre combustíveis e energia, cuja relatoria também é de Bezerra. O mesmo modelo foi adotado em março, quando um projeto de lei negociado entre governo e Congresso alterou a cobrança do imposto estadual e, ao mesmo tempo, zerou as alíquotas de PIS e Cofins sobre o diesel.

O projeto de lei classifica itens como combustíveis e energia como bens e serviços essenciais e, com isso, busca estabelecer um teto na alíquota de ICMS aplicada a eles.

O projeto pega carona em uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que exigiu que itens essenciais não podem sofrer cobranças superiores à alíquota básica aplicada pelo estado. Alguns governadores chegam a cobrar até 25% sobre o diesel e 34% sobre a gasolina (enquanto o ICMS básico é de 17% a 18%, dependendo do estado).

A criação de um teto de ICMS sobre esses itens não será compensada pela União. O que será indenizado é a redução do teto de 17% para zero nas alíquotas de diesel e gás de cozinha até o fim do ano.

Na Economia, a expectativa é que tanto a PEC quanto o projeto sejam aprovados dentro de uma semana no Senado. Em entrevista nesta terça, Bezerra reforçou esse prazo e disse que ainda apresentará uma segunda PEC, com o objetivo de manter a competitividade do etanol após a redução de tributos sobre a gasolina.

Já o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que o projeto de lei que trava o ICMS sobre combustíveis e energia deve ser votado na próxima segunda-feira (13), mas não se comprometeu com prazos para a apreciação da PEC dos Combustíveis.

"As PECs, uma vez formalizadas e tendo condições procedimentais, com as assinaturas suficientes para a tramitação, aí nós vamos avaliar o momento para a apreciação delas, se devem passar pela CCJ [Comissão de Constituição e Justiça] ou se irão direto ao plenário", disse Pacheco.

Após aprovação no Senado, ambas as propostas ainda terão de passar por votações na Câmara dos Deputados.

A preocupação dentro do governo é obter uma aprovação célere. Bolsonaro está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Membros da campanha do atual chefe do Executivo já alertaram que o preço dos combustíveis é um grande obstáculo para a sua reeleição.

PROPOSTA ABRE PRECEDENTE DE REPASSE BILIONÁRIO PARA PRESIDENTE E GOVERNADORES EM ANO ELEITORAL

Apesar da pressa, o debate em torno da PEC é considerado desafiador. Embora o instrumento dê segurança do ponto de vista jurídico para os técnicos assinarem os documentos com a liberação dos recursos, há preocupação com o precedente criado. Na prática, o Congresso vai autorizar um repasse bilionário para estados no ano em que tanto presidente quanto governadores disputarão eleições.

A proposta também precisará afastar dispositivos da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e da Constituição para permitir a desoneração de tributos federais e o repasse aos estados fora do teto de gastos (que impede o crescimento real das despesas federais). Outra discussão relevante é se o dinheiro repassado aos estados será repartido com os municípios, assim como ocorre com o ICMS.

Em entrevista nesta terça, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), estimou em R$ 65 bilhões as receitas extraordinárias obtidas pelo governo que poderão ajudar a financiar o conjunto de medidas contra a alta dos combustíveis —isso sem contar os ganhos com royalties de petróleo, que também estão em alta. Ou seja, mais dos que o teto de R$ 50 bilhões com que Guedes trabalha para o conjunto das medidas.

Nos cálculos de Lira, seriam R$ 40 bilhões de dividendos extras da Petrobras e R$ 25 bilhões arrecadados com a capitalização da Eletrobras.

O presidente da Câmara afirmou que, se houver acordo com a oposição, a PEC pode ser levada direto ao plenário. Caso isso não seja possível, ele prometeu acelerar a tramitação na Casa.

"Essas PECs serão votadas até antes do recesso [de julho]. Vamos supor que seja votado o PLP 18 [projeto que limita o ICMS em 17%] na segunda-feira e o governo mande o texto da PEC na segunda-feira, a gente remete para a [Comissão de] Constituição e Justiça, há de se ter um esforço, para aprovar rápido, se cria comissão especial", disse.

Como antecipou a Folha, a PEC para subsidiar combustíveis surgiu como alternativa ao decreto de calamidade pública, que voltou a ser defendido pela ala política do governo, mas enfrentava resistência de técnicos da área econômica.

Nesta terça, Bolsonaro destacou, porém, que a possibilidade de decretar calamidade não está descartada.

"Não está enterrado [o decreto de calamidade]. Está ali, é uma arma que você tem e pode apertar o botão na hora que você entender. Neste momento, foi estudado e chegamos à conclusão que não era o caso apertar o decreto de calamidade", disse o presidente, citando consequências como a proibição à concessão de reajustes a servidores.

Autor/Veículo: Folha de S.Paulo
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