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Em aceno a caminhoneiros, Bolsonaro vai reduzir PIS/Cofins e quer mudar ICMS sobre combustíveis

Pressionado por caminhoneiros, o presidente Jair Bolsonaro anunciou nesta sexta-feira que vai propor ao Congresso um projeto de lei para mudar as regras do ICMS sobre combustíveis. O plano foi decidido durante reunião com ministros e o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco.
A medida, que consiste em alterar o funcionamento de um tributo estadual, foi criticada por especialistas e pelo governador de São Paulo, João Doria. O pacote para tentar diminuir o preço do diesel nas bombas inclui ainda uma redução do PIS/Cofins sobre combustíveis que, segundo o governo, poderia ser feita sem a necessidade de compensar a perda de arrecadação com elevação de outro imposto.
A proposta para alterar o ICMS deve ser apresentada semana que vem. Segundo o presidente, o objetivo é dar “previsibilidade”. Ele não detalhou o projeto, mas afirmou que há duas possibilidades: ou que o imposto passe a ser calculado a partir do preço da refinaria ou que tenha um valor fixo em cada estado.

Hoje, o tributo é cobrado no momento do abastecimento, em alíquotas que variam em cada unidade da federação e incidem sobre a média dos preços dos últimos 15 dias.
— Nós pretendemos ultimar um estudo e, caso seja viável, seja juridicamente possível, apresentaremos ainda na próxima semana (um projeto) fazendo que o ICMS venha incidir sobre o preço dos combustíveis nas refinarias ou um valor fixo para o álcool, a gasolina e o diesel. E quem vai definir esse percentual ou esse valor fixo serão as respectivas Assembleias Legislativas — disse Bolsonaro, que negou que o governo vá interferir na política de preços da Petrobras.

O presidente afirmou que não haverá queda na arredação para estados, mesmo com outra metodologia, sem explicar como isso ocorreria.
Essa não é a primeira vez que Bolsonaro sugere a medida. O presidente propôs as mesmas alterações no ano passado, mas não chegou a enviar texto ao Congresso. A nova tentativa voltou a ser criticada ontem. Em São Paulo, Doria afirmou que a ideia ameaça o equilíbrio fiscal dos estados:

— Não é cabível que o presidente queira vulnerabilizar o equilíbrio fiscal dos estados, transferindo a responsabilidade pela eliminação ou redução do ICMS sobre combustíveis.
O economista Fabio Klein, especialista em contas públicas da consultoria Tendências, observou que, na prática, a proposta é como se o governo quisesse criar um sistema tributário à parte.

— Além disso, vejo intervenção do governo federal, já que ICMS é um assunto estadual. E, ao agir dessa maneira, o governo vai contra a tese liberal que defende, já que se trata de comportamento intervencionista para a formação do preço final de um produto.

Um quarto da arrecadação
Para o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, para haver alíquota única de ICMS é preciso consenso entre os estados:

— A Constituição proibiu as chamadas isenções heterônomas, em que um ente da federação se submete a outro.

A ideia, no entanto, é vista como positiva pelo presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), Paulo Miranda. Ele diz que o estabelecimento de um valor fixo em todo o país pode ajudar a reduzir a guerra fiscal e a sonegação no setor.

Hoje, cada estado tem uma alíquota diferente. No Rio, a incidência de ICMS na gasolina, por exemplo, é de 34%, maior que em São Paulo (15%), Minas Gerais (31%) e Espírito Santo (27%).

— Isso faz com que as empresas cruzem fronteiras, comprem o combustível mais barato e não paguem a diferença do IMCS, aumentando o mercado irregular. Mas, na atual crise econômica, é uma mudança complexa, já que, em média, o ICMS de combustível representa um quarto da arrecadação com o tributo — comentou Miranda.

Em nota, o Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda (Comsefaz) afirmou que a alta nos preços não tem relação com a tributação estadual e atribui o problema à política de preços da Petrobras, que prevê reajustes baseados na paridade do mercado internacional.

No texto, o colegiado defende a aprovação da reforma tributária para corrigir distorções e destaca que tributos federais, como PIS e Cofins, também contribuem para a formação do preço na bomba.
A Petrobras, por sua vez, informou, em comunicado, que a empresa tem 12 meses para alinhar o valor da gasolina e do diesel vendidos no Brasil com o do exterior: “Desse modo, em dado trimestre, os preços domésticos podem eventualmente se situar abaixo do preço de paridade de importação desde que essa diferença seja mais do que compensada nos trimestres seguintes”.Alívio sem compensação
Além das mudanças no ICMS, Bolsonaro disse que reduzirá a cobrança de PIS/Cofins sobre combustíveis. Nos últimos dias, o presidente havia dito que só poderia adotar essa medida se a renúncia fosse compensada por outra fonte de recursos, como o aumento de outro tributo.

Hoje, no entanto, ele e o ministro da Economia, Paulo Guedes, mudaram de posição. Segundo eles, o alívio tributário seria bancado pela arrecadação acima do projetado, por causa da recuperação da economia.

— O consumo de diesel em janeiro foi na ordem de (aumento de) 19%, levando em conta janeiro do ano passado. Então, como isso aumenta a arrecadação, o Paulo Guedes sugere diminuir o PIS/Cofins sem uma fonte de compensação — disse Bolsonaro.

Guedes, por sua vez, afirmou que é preciso um “jogo da compensação” para reduzir impostos, sem dar detalhes.

— Por um lado, ele (Bolsonaro) gostaria de zerar esse imposto federal (PIS/Cofins), hoje de R$ 0,35. Só que cada centavo são R$ 575 milhões. Ou seja, R$ 0,02, R$ 1 bilhão. Isso exige uma compensação pelo compromisso de responsabilidade fiscal.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) prevê que qualquer renúncia fiscal seja acompanhada de uma compensação. Perguntado sobre a possibilidade de que o plano seja ilegal, o Ministério da Economia afirmou que a redução do PIS/Cofins não se enquadra na restrição.

O economista José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público e considerado um dos pais da LRF, diz que desconhece regra que permita a medida:

— Sabe-se de vários projetos parlamentares criando gastos sob o mesmo pretexto, que o Executivo sempre vetou.

Autor/Veículo: O Globo
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