ICMS dos combustíveis agrada mercado, mas contraria estados
O desfecho da tramitação do PLP 136/23, aprovado pela Câmara dos Deputados na quinta-feira (14/9), atendeu às expectativas do setor de combustíveis, mas contrariou a vontade expressa das secretarias estaduais de Fazenda. A proposição ainda passará pelo crivo do Senado Federal.
O texto final do relator, Zeca Dirceu (PT/SP), manteve trechos das leis complementares 192/22 e 194/22, em linha com os interesses do mercado de combustíveis, como havia antecipado o político epbr.
Por outro lado, deixou de cumprir cláusulas do acordo mediado pelo ministro Gilmar Mendes entre União, estados e municípios, em dezembro do ano passado, que devolveria ao Confaz a competência para deliberar sobre o ICMS da gasolina, etanol anidro, diesel e GLP – conforme as partes concordaram durante a conciliação no STF.
Em resumo: o imposto interestadual fica como está, sem brecha para debate sobre permanência ou não da alíquota fixa (ad rem), da monofasia e da essencialidade. Caem apenas os trechos das LCPs 192/22 e 194/22 que limitavam o reajuste dos valores, alterando a carga tributária.
A proposição, portanto, pretende acabar com o intervalo mínimo de um ano entre a primeira fixação e o primeiro reajuste das alíquotas. Também dá fim à periodicidade de seis meses para cada reajuste subsequente, e dispensa o uso de estimativas da evolução do preço dos combustíveis nos cálculos para atualização dos valores.
Esses prazos e regras de reajustes foram inseridos nas leis para, na prática, limitar a carga tributária dos combustíveis nos estados. Os textos avançaram pelas mãos da base e do governo do então presidente Jair Bolsonaro (PL), às vésperas da corrida eleitoral.
Quem quer dinheiro tem pressa
A versão original do PLP 136/22, de autoria do governo federal, trazia de forma literal todos os termos do acordo celebrado no STF.
Em relação à essencialidade, por exemplo, previa alteração no Código Tributário Nacional para desfazer a mudança resultante da LCP 194/22, do governo Jair Bolsonaro (PL), que fixou os combustíveis no rol de bens e serviços essenciais. À época, a medida visava ao impulsionamento da candidatura do então postulante à reeleição.
Na Câmara, Zeca Dirceu chegou a receber uma demanda dos estados para que o texto inicial do governo fosse preservado. Porém, havia pressa para aprovação da matéria, que também trata da antecipação de R$ 10 bilhões do saldo devido pela União. O montante diz respeito às perdas com as mudanças de ICMS decorrentes das LCPs 192/22 e 194/22, que totalizam R$ 27 bi.
Assim, para que a questão do ICMS dos combustíveis não fosse uma trava à liberação de recursos para estados e municípios, praticamente um ano antes das eleições municipais de 2024, o petista optou por retirar os trechos envoltos em divergências. Prefeitos pressionam a base governista para que a proposição seja aprovada o quanto antes. Eles têm direito a 25% do total (R$ 6,7 bi).
Zeca Dirceu deu foco total às regras e diretrizes da compensação financeira, incluindo ainda uma verba extra decorrente da reposição de repasses constitucionais (FPE e FPM) não realizados nos últimos meses.
“Tudo o que poderia gerar dúvida, por vontade dos líderes, e quero aqui agradecer e cumprimentar a todos, inclusive os que são da base do governo e os que são da oposição, os textos que poderiam gerar dúvida foram suprimidos pelo relator”, explicou Zeca Dirceu ao ler o parecer no plenário, na quinta.
Pontos de vista diferentes
Por parte do setor de combustíveis, há o entendimento de que as inovações propostas originalmente poderiam abrir uma brecha para o retorno do modelo ad valorem (percentual de imposto sobre o preço médio dos combustíveis).
Isso porque, nos termos do acordo do STF, não se fala claramente na adoção de uma alíquota fixa, e sim na garantia da competência dos entes federados para que estes possam optar, por meio do Confaz, entre o ad rem ou o ad valorem, com base na legislação em vigor – ou seja, na lei complementar 192/22.
Com a revogação dos dispositivos da LCP 192/22, o setor entende, portanto, que os estados voltariam a ter possibilidade legal de escolher por conta própria aquilo que for mais conveniente a cada governo estadual, a depender de variáveis econômicas.
Os estados, por sua vez, entendem que a não revogação de trechos das LCPs 192/22 e 194/22 perpetuam o erro que a mediação do STF buscou corrigir sobre a competência constitucional para definir o modelo do ICMS dos combustíveis (ad rem ou ad valorem). É uma decisão que caberia ao Confaz.
As secretarias estaduais de Fazenda argumentam ainda que não há qualquer possibilidade de retorno ao modelo ad valorem, embora esta não seja uma posição unânime entre todos os membros do Consefaz. O colegiado aguarda o início da tramitação da proposta no Senado para tentar uma articulação.
Do outro lado, o IBP informou que vai trabalhar para que o Senado mantenha as premissas acordadas na Câmara. O Instituto Combustível Legal (ICL) comemorou a aprovação do texto com a manutenção da essencialidade, mas cobra a inclusão do etanol hidratado no modelo monofásico.