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Oferta de ações atrai R$ 33,7 bi e Eletrobras é desestatizada

Com uma acirrada disputa entre investidores, o papel da estatal foi cotado a R$ 42. A venda da empresa de energia por meio da Bolsa foi o maior movimento de desestatização do Brasil em duas décadas.

A oferta de ações que resultou na privatização da Eletrobras movimentou cerca de R$ 33,7 bilhões, depois de o preço de cada papel ser fixado em R$ 42, segundo fontes de mercado. O ajuste de preço foi alvo de uma intensa disputa entre investidores locais e estrangeiros, que só terminou depois das 20h de ontem. A venda da estatal de energia via Bolsa foi a maior operação de desestatização do País em duas décadas – e a segunda no governo Bolsonaro, depois da venda da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), em março.

O preço de R$ 42 representou um desconto de 4% em relação ao valor da ação ao fim do pregão de ontem, de R$ 44. Além de ter sido uma das maiores ofertas de ações em todo o mundo até aqui no ano, a operação da Eletrobras foi a maior operação na B3, a Bolsa brasileira, desde a megacapitalização da Petrobras, em 2012, que movimentou R$ 100 bilhões.

Com a venda, o governo deverá ter sua participação na empresa reduzida de 60% para cerca de 35%, deixando de ser o controlador. Grandes investidores marcaram presença na operação, entre eles, o fundo 3G Capital (dos fundadores da Ambev) e o banco Clássico, de José Abdalla Filho (relevante acionista da Petrobras).

A oferta da Eletrobras teve um empurrão importante com a possibilidade de uso de recursos do FGTS para a compra de ações. Diante da oportunidade, cerca de 350 mil pessoas reservaram ações da companhia. O teto para uso do FGTS era de R$ 6 bilhões, mas a demanda ficou em R$ 9 bilhões, ou 50% a mais. Por essa razão, deverá haver uma redução em relação aos valores reservados por trabalhadores. O investidor que fez uso de seu FGTS para entrar na oferta não poderá se desfazer do investimento por um prazo de no mínimo 12 meses – exceto em alguns casos, como o de demissão sem justa causa. •

A concretização da privatização da Eletrobras, com a oferta de ações concluída ontem, foi recebida com otimismo por analistas, que acreditam na redução do risco relacionado à empresa do setor elétrico. Assim, a maioria dos bancos e casas de análise projeta uma valorização dos papéis da companhia. Apesar desse alívio pontual para o mercado – após um período de marasmo, a operação movimentou cerca de R$ 33,7 bilhões –, o consenso é de que a operação não deve servir para reanimar o mercado de IPOs (ofertas iniciais de ações, na sigla em inglês), parado desde agosto de 2021.

Em relação à privatização da companhia, um dos primeiros passos esperados por fontes de mercado ouvidas pelo Estadão é a troca de executivos da companhia e também do conselho de administração. Com a redução de sua participação, o governo terá menos assentos no colegiado, abrindo espaço para que fundos de investimento indiquem seus representantes.

A partir dessa mudança, o novo conselho deverá fazer uma mudança geral no quadro administrativo da empresa, incluindo todo o alto escalão.

FÔLEGO. Analistas do setor acreditam que a empresa poderá ter mais fôlego para investir, incluindo em fontes de energia renováveis. “A Eletrobras terá exatamente o mesmo modelo de governança que já foi testado em outras privatizações do setor elétrico na Europa. A disponibilidade de caixa e o uso do mercado de capitais para novas captações vão permitir novos planos de investimento que são essenciais no segmento”, aponta Fabio Coelho, presidente da Amec, associação que representa mais de 60 investidores, entre locais e estrangeiros, que têm investimento de mais de R$ 700 bilhões na Bolsa brasileira.

Segundo Coelho, um dos pontos relevantes na “nova Eletrobras” será uma maior agilidade na tomada de decisão. “É importante ressaltar que o governo continuará sendo o maior acionista individual, e que, portanto, terá acesso a maior porcentual dos lucros esperados, justificando, assim, o interesse público na operação”, comenta.

EFICIÊNCIA. Sócio do M3BS Advogados e especialista em negócios públicos, Lucas Miglioli afirma que, com a privatização, a Eletrobras deve se tornar mais eficiente. “Tornando sua burocracia mais compatível com a do setor privado, terá mais agilidade para enfrentar um cenário cada vez mais competitivo e ávido por novas tecnologias”, disse. “A expectativa é de que, ao deixar de ser controlada pela União, a Eletrobras deixe de atuar como mera operadora e ganhe protagonismo no setor.”

Para o público em geral, uma das expectativas é de que a conta de luz fique mais barata, mas pode não ser bem assim. Sócio do PMMF Advogados e especialista em direito público, Ulisses Penachio lembra que apenas parte do novo capital – aquele destinado à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) – poderá gerar alguma redução nas tarifas. “A médio e longo prazo, o impacto da privatização na tarifa tende a ser neutro”, aponta. •

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo
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