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PEC da Transição permite gasto extra de R$ 200 bilhões em 2023

Entregue pelo vicepresidente eleito Geraldo Alckmin (PSB) ao Congresso, o texto preliminar da PEC da Transição prevê a retirada por tempo indeterminado do Auxílio Brasil do teto de gastos e abre a possibilidade de que o governo ultrapasse em cerca de R$ 200 bilhões o limite previsto para as despesas em 2023. O documento menciona ainda a possibilidade de ampliação de dispêndios quando houver receitas extras. Embora o texto não especifique o valor, o custo do Auxílio Brasil, que voltará a se chamar Bolsa Família, está estimado em R$ 175 bilhões, o que contempla o valor do benefício em R$ 600 e R$ 150 adicionais por criança até seis anos nas famílias. Os economistas André Lara Resende, Guilherme Mello, Nelson Barbosa e Pérsio Arida, integrantes da equipe de transição, ficaram fora das discussões da PEC.

“A questão da ancoragem fiscal vai ser debatida com mais calma. Não será neste momento”, Geraldo Alckmin (PSB), vice eleito

Texto preliminar da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição apresentado ontem ao Congresso prevê a retirada do Auxílio Brasil do teto de gastos por tempo indeterminado e permite que o governo gaste em 2023 cerca de R$ 200 bilhões acima do limite previsto para as despesas. O documento, apresentado pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB), também cria a possibilidade de ampliar despesas quando houver receitas extras.

Embora o texto não detalhe o valor, o custo do Auxílio Brasil, que voltará a se chamar Bolsa Família em 2023, está avaliado em R$ 175 bilhões – o que contempla o valor do benefício em R$ 600 e os R$ 150 adicionais por criança de até seis anos, promessa feita pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante a campanha.

Durante o dia, antes da apresentação da PEC, o mercado se mostrou apreensivo. O dólar subiu 1,55% – foi a R$ 5,3817 – e a Bolsa fechou em queda de 2,58%.

Se aprovada, a proposta abrirá no Orçamento de 2023 um espaço de R$ 105 bilhões, que é o valor previsto para o programa social do ano que vem. Esses recursos seriam realocados para outras áreas, como a recomposição da verba do Farmácia Popular, o aumento real (acima da inflação) do salário mínimo e a ampliação de investimentos públicos.

O texto prevê ainda a possibilidade de ampliar as despesas com investimentos públicos quando houver receitas extraordinárias – ou seja, quando o governo arrecadar mais do que o previsto –, como royalties de petróleo, por exemplo. A proposta permitiria um gasto extra de R$ 22 bilhões, segundo o relator-geral do Orçamento, Marcelo Castro (MDB-PI). O texto autoriza que as universidades usem receitas próprias como convênios e doações de forma livre, sem a amarra do teto que limita as despesas do governo à variação da inflação.

‘MINUTA’. Castro, que recebeu o documento, afirmou que o texto levado ao Senado não é a PEC propriamente dita, mas uma “minuta” que será, agora, debatida e formulada pelo Congresso. “A equipe de transição nos trouxe sugestões. Essa PEC será feita pelo Senado”, disse Castro.

A expectativa é de que até segunda-feira sejam colhidas ao menos as 27 assinaturas obrigatórias de senadores para que o texto possa ser enviado à Comissão de Constituição e Justiça do Senado e, uma vez aprovado, vá para o plenário da Casa. “Queremos aprovar antes de findar o mês de novembro”, disse.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmou que a proposta “vai ser construída a várias mãos”. “Cada um sai daqui com um dever de casa. Isso é uma construção política”, disse Alcolumbre. Já Alckmin disse que “a recepção foi muito boa” e que o clima é favorável à aprovação do texto até a data limite de 17 de dezembro. •

Escolhidos para trabalhar no grupo de economia na transição, André Lara Resende, Guilherme Mello, Nelson Barbosa e Pérsio Arida ficaram de fora das negociações da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição apresentada ontem, ao Congresso, pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin.

Eles foram “aconselhados” a ficar de fora da discussão. Essa sinalização ficou clara quando Guilherme Mello chegou ontem cedo ao Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), sede do gabinete de transição em Brasília, e disse que a “PEC era com o Senado”.

O senador eleito Wellington Dias (PT-PI), destacado pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para cuidar da articulação política da PEC, admitiu que os economistas estão apartados das conversas sobre o assunto, mas minimizou a ausência deles. “A missão do grupo de trabalho da economia é mais abrangente”, disse ele, ao Estadão.

Uma reunião de forma virtual do grupo estava marcada para ontem, antes da entrega da PEC ao Congresso, mas não ocorreu. Os quatro não têm dado entrevistas sobre o assunto nem participado das reuniões para debater o texto. A reportagem apurou que as questões apontadas por eles sobre a PEC não serão absorvidas.

A ausência da participação dos economistas na discussão da PEC segue incomodando os investidores, contribuindo para a piora de preços de ativos no mercado. Quando o quarteto foi anunciado, a expectativa era de que participasse das negociações. Daí, a frustração de agora.

REGRA FISCAL. Também não foi bem recebida a fala de Alckmin de que a “ancoragem fiscal” será debatida mais à frente – ou seja, a definição de uma nova regra fiscal vai ficar para 2023. Ele acrescentou que o novo governo vai trabalhar pela responsabilidade fiscal, mas os agentes econômicos querem ver os planos da equipe de Lula para garantir a sustentabilidade da dívida no médio e longo prazo.

“É muito impressionante que a opinião da área econômica seja irrelevante para discutir um volume de gastos que pode representar 83% da economia da reforma da Previdência com um gasto de R$ 175 bilhões (por ano)”, criticou o ex-secretário do Tesouro Jeferson Bittencourt, economista da gestora ASA Investments, antes de conhecer os detalhes da PEC. Ele lembra que a reforma previdenciária pretendia economizar entre R$ 800 bilhões e R$ 850 bilhões em dez anos.

Pelos seus cálculos, sem que haja um aumento considerável da carga tributária e adotando um cenário relativamente otimista, a dívida bruta ao fim do mandato de Lula estaria em cerca de 89% do PIB, ante estimativa de terminar em 75% neste ano.

“É incrível que, mesmo com vários especialistas alertando o novo governo para não cometer o erro do Reino Unido, essa transição está parecida em vários aspectos. A última é essa ausência do quarteto de economistas na discussão da PEC”, avaliou o economista-chefe da Blueline, Fábio Akira. “Tirar os técnicos da discussão foi malvisto no Reino Unido e está pegando muito mal no Brasil”, disse. •

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo
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