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PEC deve mirar agora fila do Auxílio Brasil

Com o Senado envolvido na disputa política para instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar desvios no Ministério da Educação, não houve acordo em torno da cesta de medidas e do custo da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos combustíveis – considerada primordial pelo governo em pleno ano eleitoral.

Os pilares da PEC são os mesmos já anunciados na semana passada, mas os governistas querem ampliar o custo do pacote para também zerar a fila do Auxílio Brasil, com a inclusão de pelo menos mais 1,5 milhão de famílias, e melhorar o alcance do vale-gás (de bimestral para mensal, com o valor integral do preço do botijão de 13 quilos).

Pela segunda vez, o relator da PEC, senador Fernando Bezerra (MDB-PE), adiou a apresentação do parecer, que estava programada para ontem. A apresentação ficou para hoje. Bezerra teve uma reunião com integrantes da equipe econômica, que tenta conter o custo do pacote ao valor máximo de R$ 54 bilhões, mas há uma pressão para ampliar os benefícios.

Hoje, segundo apurou o Estadão, o custo está entre R$ 52 bilhões e R$ 54 bilhões. Esse valor inclui a desoneração dos tributos federais sobre a gasolina e a zeragem do Pis/cofins e da Cide (tributos federais) da gasolina e do etanol até o fim do ano. Essa medida já foi aprovada pelo Congresso. Um integrante da equipe econômica disse que o foco das negociações é o “tamanho do cheque”.

AUXÍLIO BRASIL. Os governistas querem aproveitar a PEC para zerar a fila do Auxílio Brasil, porque esse é um problema que não foi solucionado com a criação do benefício. A fila tem sido usada pela oposição para criticar o fim do antigo programa Bolsa Família, criado no governo do ex-presidente Lula (PT), e o aumento da fome no governo Bolsonaro.

O presidente Jair Bolsonaro já acenou também com a concessão de duas cotas de R$ 600 para mulheres em condições especiais. A promessa, porém, não chegou ao Ministério da Cidadania para análise dos técnicos. Eles foram surpreendidos pela fala do presidente. Em 2020, mulheres mães solos receberam duas cotas do auxílio emergencial. Para repetir isso, será preciso orçamento além do custo de subir o piso do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600. Os recursos ficarão fora do teto de gastos, a regra que limita o crescimento das despesas à variação da inflação.

O tamanho da fila no momento não é divulgado pelo Ministério da Cidadania. Mas segundo apurou o Estadão, estaria hoje entre 1 milhão e 1,5 milhão, com o aumento acelerado dos cadastros das famílias.

O Auxílio Brasil turbinado e o vale-gás vão receber orçamento superior aos R$ 23,1 bilhões estimados inicialmente nas discussões da PEC. Ao longo do dia de ontem, o orçamento adicional estava próximo de R$ 30 bilhões para os dois benefícios. •

Valor Considerando as últimas negociações, custo do pacote já oscila entre R$ 52 bi e R$ 54 bi

A pressão que o governo Bolsonaro e o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistasal), têm feito para aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria o bolsacaminhoneiro e amplia auxílios voltados à população de baixa renda atropela todo o rito legislativo que está previsto na votação de um texto do gênero.

Nos planos de Lira, a PEC será votada em dois dias, um processo que, em condições normais de consenso parlamentar, costumaria levar meses para ser concluído, pelo simples fato de a PEC ser um dos textos mais importantes do processo legislativo, ao mexer diretamente com a Constituição federal.

No cronograma do governo, o texto deve ser submetido já hoje ao plenário do Senado, para seguir amanhã para a Câmara. Uma vez votado pelos deputados, o pacote seria promulgado pelo Congresso.

Pelo rito legislativo, qualquer PEC que seja apresentada – seja pelo presidente da República, por um terço dos deputados (171) ou por um terço dos senadores (27) – tem de ter seu texto submetido, inicialmente, à Comissão de Constituição e Justiça. É a CCJ que avalia se a proposta viola alguma cláusula pétrea prevista na Constituição.

Se o texto for aprovado na CCJ, forma-se, então, uma comissão especial para analisar o mérito dessa PEC. É o momento de discussão aprofundada do texto. A comissão tem de realizar ao menos dez sessões parlamentares para avaliar o texto e eventuais alterações na proposta original. Se for necessário, a comissão pode fazer até 40 sessões até que o texto siga para votação.

Uma vez aprovada, a proposta vai ao plenário de cada Casa. Tem de passar por dois turnos de votação, sendo que a aprovação só é confirmada com os votos favoráveis de 308 deputados e de 49 senadores, equivalentes a três quintos de cada Casa. Só após todo esse processo é que a PEC pode ser promulgada, em sessão realizada pelo Congresso Nacional.

‘AMARRAÇÃO’. “É preciso aguardar o relatório, para entender como se fez a amarração deste conjunto de improvisos e devaneios. E também lembrar o descumprimento do acordo de manutenção de valores para Fundeb, Educação e Saúde, que foram vetados por Bolsonaro. Defendo que este é um ponto que deve ser resolvido antes de avançar em qualquer outra coisa”, diz o senador Alessandro Vieira (PSDB-SE).

Na avaliação de Vieira, se tudo corresse de forma acelerada, com matéria consensual, seria possível aprovar uma PEC “em algumas semanas”.

O líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), discorda da avaliação de atropelo do processo legislativo e cita ações de outros países, que já fizeram repasses de dinheiro à população. “O assunto é urgente. Emergência internacional. O mundo está seguindo os mesmos caminhos do Brasil, como a Espanha”, disse ele. “A Espanha fez corte de impostos e benefícios na ponta. Copiando-nos, enquanto discutimos.”

‘JEITINHO’. “A PEC 16 é um jeitinho que estão buscando para burlar as regras que norteiam o Direito Eleitoral, e que incluem princípios e normas constitucionais. Ela (a PEC) é populista, assistencialista e fere os princípios da razoabilidade e da moralidade, na medida em que estão falindo o Estado brasileiro para financiar uma reeleição (de Bolsonaro)”, diz Alexandre Rollo, doutor em Direito pela PUC/SÃO Paulo e conselheiro estadual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP).

Para o advogado Acacio Miranda da Silva Filho, doutor em Direito Constitucional e professor de Direito Eleitoral, “salta aos olhos a celeridade imposta ao projeto, fato não replicado nos demais temas que tramitam no Congresso”. •

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo
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