Projetos de petróleo e gás voltam com força em diversos países
Quando o governo Joe Biden deu luz verde ao projeto de petróleo Willow, de US$ 8 bilhões, em North Slope, no Alasca, no mês passado, muitos criticaram a mudança como uma traição à promessa dos Estados Unidos de se afastar dos combustíveis fósseis para combater a mudança climática.
Mas uma análise de dados globais mostra que o Willow representa uma pequena fração de centenas de novos projetos de extração de petróleo e gás aprovados no ano passado em todo o mundo, incluindo muitos outros nos Estados Unidos. E prevê-se que nos próximos meses mais dezenas de projetos sejam aprovados.
Os dados refletem uma indústria crescente de combustíveis fósseis que se recuperou aos níveis de crescimento pré-pandêmicos. Embora nos últimos anos muitos países tenham instituído políticas que incentivam a energia renovável, a demanda por combustíveis fósseis continua alta.
A invasão da Ucrânia pela Rússia elevou os preços do petróleo, contribuindo para lucros recordes para as empresas de combustíveis fósseis, enquanto os governos lutavam para garantir seus suprimentos de energia, fazendo os preços dispararem.
"É uma recuperação total", disse Espen Erlingsen, sócio da Rystad Energy, empresa de pesquisa que forneceu os dados. "O futuro desse crescimento depende da política. Se o mundo quiser limitar o aquecimento, terá que limitar a demanda por petróleo e gás, porque essa indústria pode fornecer esse tipo de volume por muitas décadas ainda."
Grande parte do crescimento está ocorrendo em nações tradicionais produtoras de petróleo e gás, como Estados Unidos, Arábia Saudita e Noruega. O gás, em particular, está crescendo. O Catar planeja inaugurar a maior instalação de produção de gás do mundo em 2025.
Nos Estados Unidos, o fracking de xisto para gás está ressurgindo, representando muitas vezes o nível de investimento e extração de um projeto como Willow.
Embora o gás cause menos emissões de gases de efeito estufa do que o petróleo, a expansão da exploração de gás é incompatível com os compromissos que as nações assumiram de limitar as emissões, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC na sigla em inglês), o proeminente grupo de cientistas que estudam o aquecimento global.
O IPCC diz que a produção de combustíveis fósseis deve começar a diminuir acentuadamente agora para evitar os efeitos mais catastróficos da mudança climática.
Vastos novos campos de petróleo também foram aprovados para exploração por empresas multinacionais ocidentais na Guiana, Brasil e Uganda, entre outros. Alguns países em desenvolvimento têm argumentado que a renda dos combustíveis fósseis —essencial para a prosperidade do mundo industrializado— também é um direito deles, e que a mitigação da mudança climática é em grande parte responsabilidade dos países ricos.
O presidente de Gana, Nana Akufo-Addo, deixou esse argumento claro para Kamala Harris, a vice-presidente dos EUA, que o visitou na semana passada. Os combustíveis fósseis são um recurso "que meu governo está tentando usar como base para transformar sua economia", disse ele, ao lado de Harris. A extração deles ajudaria seu país a se livrar da dependência da ajuda externa, afirmou.
Os países ocidentais reuniram empréstimos para os principais países dependentes do carvão, como África do Sul, Vietnã e Indonésia, para ajudá-los a desenvolver alternativas renováveis. Mas enquanto o desenvolvimento do carvão vem caindo em todo o mundo (com as notáveis exceções da China e da Índia), as economias de muitos países, ricos e pobres, continuam dependentes de combustíveis fósseis.
O carvão é um combustível fóssil particularmente sujo, e queimá-lo continua sendo um dos principais produtores de emissões de gases de efeito estufa que aquecem o planeta.
As perspectivas da indústria de petróleo e gás eram decididamente diferentes quando os efeitos devastadores da pandemia na economia global ficaram claros em 2020. Após muitos anos de crescimento constante, as empresas revisaram o crescimento para baixo e adiaram ou cancelaram projetos.
O custo das fontes de energia renovável, como eólica e solar, também estava diminuindo rapidamente para níveis competitivos com os combustíveis fósseis. Políticas climáticas progressistas na Europa e, mais tarde, nos Estados Unidos acrescentaram a incerteza sobre o papel dos combustíveis fósseis em tudo, desde redes elétricas até transportes.
À medida que a economia global voltou a crescer, entretanto, o mesmo aconteceu com a demanda por petróleo e gás. Em meio aos lucros recordes que as empresas de combustíveis fósseis obtiveram no ano passado, algumas também estenderam os cronogramas de produção para o futuro, basicamente renegando as promessas de fazer a transição de seus negócios, ainda que lentamente, para a energia renovável.
Trilhões de dólares estão sendo investidos em infraestrutura de combustíveis fósseis, disse Michael Lazarus, cientista e diretor de pesquisa do Instituto do Meio Ambiente de Estocolmo, grupo de pesquisa científica que monitora projetos de combustíveis fósseis.
"Muito desse desenvolvimento está prestes a acontecer no final desta década, quando realmente precisaremos estar numa rota de declínio dos combustíveis fósseis", disse Lazarus. "As empresas de petróleo e gás estão essencialmente apostando que a demanda permaneça tão alta quanto hoje."
Sem uma política que busque diretamente limitar tanto a produção de combustíveis fósseis quanto sua demanda, disse ele, há uma chance maior de que a aposta das empresas compense.
Mesmo nos Estados Unidos, onde a histórica legislação climática do governo Biden do ano passado está liberando centenas de bilhões de dólares para o setor de energia renovável, a produção e a demanda de petróleo e gás devem crescer.
"Não é como se os Estados Unidos fossem um dos muitos atores; tornou-se o maior produtor mundial de petróleo e gás", disse Lazarus. "Todos os sinais são de que Washington pretende manter essa posição. Isso está mostrando liderança climática? Aí está uma contradição fundamental que precisa ser destacada."