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SP tem aceleração nas mortes após reabrir

Passadas duas semanas do início do Plano São Paulo, programa de reabertura econômica da gestão João Doria (PSDB) durante a pandemia de coronavírus, a evolução das mortes por covid-19 no Estado cresceu em ritmo cinco vezes maior do que nas duas primeiras semanas de junho, segundo dados da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade).

Entre o dia 13 de junho e o dia 23, a média móvel do total diário de óbitos aumentou 28%, passando de 217 para 277 mortes, segundo as informações do governo. Entre 2 e 12 do mesmo mês, essa média também subiu, mas em taxa de 5,3%. Média móvel é uma forma usada por estatísticos para contabilizar uma tendência quando há dados em sequência, baseada nas médias dos dias anteriores. Ela indica tendências sem distorções.

Na primeira semana de junho, o Estado teve 1.526 mortes. Na semana seguinte, o número chegou a oscilar para baixo, ficando em 1.523 óbitos. Mas, na terceira semana, alcançou 1.913 registros. Os quatro dias com mais mortes registradas durante a pandemia foram atingidos nesta última quinzena. Foram 365 óbitos no dia 16, 389 no dia 17, 386 no dia 19 e 434 no dia 23, ainda de acordo com os dados da Seade.

Especialistas afirmam que medidas para atrasar ou acelerar a doença só têm impacto duas semanas após serem adotadas. O Plano São Paulo teve início no dia 1.º de junho.

O pneumologista Carlos Carvalho, coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus, órgão da gestão João Doria (PSDB) que aconselha o governador, reconhece que o crescimento pode ser indicativo do início de uma segunda onda de infecções, mas afirma que ainda não é possível falar em aceleração das mortes associada à abertura das cidades. “Os números não são consistentes. Precisamos enxergar um pouco ainda mais para frente.”

Segundo Carvalho, já havia expectativa por parte do governo de que as mortes aumentariam neste mês. Mas ele destaca que o total de mortes está abaixo das previsões, que indicavam entre 15 mil e 18 mil. “Se pegarmos a curva de mortalidade do que seria daqui para frente, o número de mortes está dentro da média, mas está próximo do limite inferior da média.”

Ele diz, porém, que os dados dos próximos dias é que darão o tom da evolução. “Se isso começar a embicar para cima, começar a encher as UTIs de novo, começar a precisar ativar leitos de hospital novamente, aí é o sinal da segunda onda. Mas, na capital, não está pintando isso.”

A avaliação da comunidade científica fora do governo não é a mesma. Para o físico Domingos Alves, professor do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, “com certeza essa nova subida que está acontecendo é por causa da flexibilização”.

O físico Roberto Kraenkel, pesquisador do Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro do Observatório Covid-19 BR, complementa: “O que a gente viu é que existe sim, no Estado, um crescimento do número de óbitos e de casos. Isso é muito provavelmente ligado ao fato de que certas cidades médias, no interior, que tinham escapado até agora de um problema maior, perderam uma oportunidade de ouro de manter o controle”. Para Kraenkel, o interior deveria ter investido na testagem ampla dos casos suspeitos, em maio, quando era possível rastrear os pacientes.

A análise da variação de mortes indica também, por outro lado, que o feriadão criado no fim de abril havia conseguido conter a disparada de óbitos. Entre os dias 22 e 29 de abril, a média móvel de mortes havia variado 160%, de 51 para 159 casos. O feriadão foi entre os dias 20 e 26. Entre os dias 29 de abril e 6 de maio, depois do período em casa, a média caiu 28%, de 159 para 114 mortes.

O matemático Renato Pedrosa, do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que trabalha com modelagens da expansão da doença, destaca que o comportamento da pandemia “é resultado do que aconteceu três semanas atrás”, quando as taxas de isolamento social passaram a ficar abaixo dos 50%, na média semanal. “O que vai acontecer nas próximas semanas já está contratado.” O médico sanitarista Gonzalo Vecina, professor da USP e colunista do Estadão, também diz que o aumento de casos e mortes é resultado de um aumento da circulação de pessoas. “Essa doença se alimenta de gente.” Para Vecina, “a epidemia só chegou ao interior agora”, embora a maioria das cidades de fora da região metropolitana já tenha obtido autorização para reabrir.

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo
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