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Tesouro ameaça retaliar Estados que forem contra o corte no ICMS

O Tesouro Nacional deflagrou uma operação para evitar um efeito cascata de liminares obtidas por governadores no Supremo Tribunal Federal (STF) que buscam compensação imediata para a perda de arrecadação com a redução do ICMS sobre combustíveis, energia e telecomunicações. O STF tem dado essa garantia via abatimento das prestações das dívidas dos Estados com a União. A ação do Tesouro marca uma escalada na tensão entre o governo Jair Bolsonaro e os Estados em torno da desoneração do imposto estadual.

Em documentos enviados aos governadores de Alagoas, Maranhão e Piauí, aos quais o Estadão teve acesso, o Tesouro afirma que a nota de crédito desses Estados, chamada de capacidade de pagamento, poderia ser “reclassificada em decorrência da declaração, no âmbito de processo judicial, de dificuldades financeiras”.

A medida foi recebida pelos secretários estaduais de Fazenda como uma retaliação do governo federal. No Tesouro, a avaliação nos bastidores é de que não seja retaliação, e sim cumprimento da lei; e que, pela norma, o Tesouro não poderia autorizar novos empréstimos com garantia para Estados que não estão pagando a dívida com a União.

Na semana passada, Maranhão, Alagoas, Piauí e São Paulo conseguiram liminares no STF com a previsão de abater dívidas com a União como compensação pela queda de receitas decorrente da fixação de teto para o ICMS – entre 17% e 18%. O impacto calculado só para este ano é de R$ 8,1 bilhões.

A legislação, aprovada pelo Congresso e sancionada por Bolsonaro, faz parte da ofensiva do Planalto para frear a alta dos combustíveis em ano eleitoral. Ela prevê compensação aos Estados quando a perda de arrecadação passar de 5%.

Procurado, o Tesouro afirmou que, por enquanto, nenhuma nota de crédito foi alterada, e que “os ofícios foram emitidos com o propósito de colher informações atualizadas junto aos Estados acerca da sua real situação financeira”. O órgão também esclareceu que, no caso de São Paulo, o STF proibiu a União de adotar procedimentos que prejudiquem a classificação de pagamento do Estado. •

Para tomar crédito com garantia do governo federal, nota que distingue bons pagadores não pode ser inferior a B

Em meio à queda de braço entre o governo federal e os governadores em torno da desoneração do ICMS, o possível rebaixamento da nota de crédito pelo Tesouro Nacional dos Estados que venham a pedir compensação pela perda de arrecadação no Supremo Tribunal Federal (STF) poderia fazer com que até 15 governadores perdessem a garantia da União para fazer empréstimos. São Estados que hoje têm a classificação B e, se rebaixados, passariam para a C.

A nota de crédito, também chamada de Capacidade de Pagamento (Capag), funciona como uma espécie de selo de bom pagador concedido pelo Tesouro. Ela avalia a saúde financeira de um Estado e qualifica se ele pode ou não receber empréstimos com garantia da União. As notas vão de A, para os Estados em melhor situação fiscal, aD, em pior situação. Estados com notas AeBpodemt omar crédito com garantia do governo federal.

Hoje, há 15 Estados com nota B, entre eles, os quatro que já obtiveram liminares no STF coma previsão de compensação da perda de arrecadação do ICMS porme iodo abatimento do pagamento de parcelas da dívida coma União( Maranhão, Alagoas, Piauí e São Paulo). O rebaixamento da nota poderia, então, ser prejudicial a esses Estados, que perderiam a garantia da União e teriam maior dificuldade para tomar crédito no mercado.

‘ENFRENTAMENTO’. O secretário da Fazenda de Alagoas, George Santoro, questiona o fato de o Tesouro justificar a possível reclassificação da nota de crédito pela declaração de dificuldades financeiras por parte dos Estados. “Em momento algum, o Estado alegou que estava em situação difícil. A gente só pediu ao Supremo para cumprir o que está na lei complementar”, diz. “É uma posição de enfrentamento aos Estados que tiveram essas decisões liminares. Parece que é uma retaliação do governo federal.”

Ele afirma que o Estado de Alagoas já consta como inadimplente no Cauc, uma plataforma do Tesouro, e foi notificado de prestação vencida e não paga em operação com o Banco do Brasil – que tem a União como garantia. “Pararam as nossas operações de crédito e, agora, tememos o bloqueio do Fundo de Participação dos Estados (FPE) no próximo dia 10, que é a contragarantia nessa operação”, diz ele. O Estado já apresentou requerimentos sobre o caso ao ministro do STF Luís Roberto Barroso.

Já o secretário da Fazenda do Piauí, Antônio Luiz Santos, questiona o entendimento do Ministério da Economia de que a compensação para as perdas dos Estados só poderia ser feita em 2023, ao comparar a perda de arrecadação do exercício de 2022 com a de 2021. “Querem que termine o ano fiscal para apurar as perdas. Seria como esperar o paciente entrar na UTI para depois agir para salvá-lo, em vez de tratar logo no começo da enfermidade”, diz.

Ele avalia que a redução do imposto sem dispositivos claros para a compensação vai comprometer o serviço público. “Os Estados estão equilibrados, porém tendem a entrar em desequilíbrio no curto prazo. Improvável que consigam prestar os mesmos serviços na educação, saúde e segurança, sem falar em outras ações sociais, se for mantida essa situação de forçarem a redução de impostos estaduais importantes, como o ICMS, sem um mecanismo de compensação”, diz Santos.

GATILHO. Esse movimento de contestação dos Estados junto ao Supremo se intensificou depois que representantes estaduais sinalizaram ao Tesouro que o texto da lei aprovada no Congresso Nacional abriria uma brecha legal para requerer uma compensação maior do que a que exceder os 5% de perda de arrecadação com o ICMS. Esse gatilho para acionar a compensação da União aos Estados foi aprovado com o projeto que fixou um teto entre 17% e 18% para o tributo sobre bens considerados essenciais, como combustíveis e energia elétrica.

Com base nessa interpretação, o governo teria de compensar toda a queda de receita quando a perda ultrapassar o gatilho dos 5%. Ou seja, se a receita cair 5%, a obrigação do governo seria compensar não somente o excedente, mas, sim, a totalidade das perdas. •

Autor/Veículo: O Estado de S.Paulo
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